MULHERES SINGULARES ( SILVIO PRADO)
Nos
livros didáticos de história do Brasil sobram personagens masculinos e faltam
mulheres. Só muito recentemente começaram a freqüentar suas páginas personagens
como Chiquinha Gonzaga, Olga Benário Prestes, Chica da Silva, por exemplo.
Antes das mulheres vindas das camadas populares, geralmente apareciam nos
livros didáticos apenas personagens femininas do setor dominante da sociedade
brasileira, como a princesa Isabel e a imperatriz Leopoldina, mais como
coadjuvantes do que personagens de peso nos eventos protagonizados também por
elas.
Como
nossa história nunca foi contada do ponto de vista da população, nos livros
didáticos a história das mulheres, como a dos negros, índios e pobres em geral,
sempre foi um relato inexistente. Por isso, quem folhear obras usadas em nossas
escolas não encontrará nelas sequer uma palavra sobre mulheres como Nísia
Floresta, nordestina que no século XIX colocou sua capacidade literária para
combater a escravidão, defender os índios e a educação, principalmente a da
mulher. Pensando na emancipação feminina, Nísia Floresta fundou um colégio só
para meninas e tornou-se a primeira a defender publicamente as idéias de
igualdade de gênero no país. No entanto, Nísia, como tantas outras lutadoras, é
uma desaparecida de nossa história.
Nos
últimos anos, um e outro livro didático tem citado, quase superficialmente, o
nome de Patrícia Galvão, também conhecida como Pagu, lindíssima mulher que
provocou dores de cabeça nos conservadores do início do século XX. Pagu
escreveu poesia, crônicas, dirigiu teatro e fez militância política. Comunista
assumida, acabou presa e torturada durante o Estado Novo de Getulio Vargas. Mas
cinco anos de prisão não serviram para calar sua voz. Sobre ela, há inúmeros
livros e também um filme longa metragem, dificilmente encontrado nas locadoras.
Mesmo com tantos registros, essa mulher que resistiu e lutou por uma sociedade brasileira democrática permanece tão escondida quanto as anarquistas Teresa Fabri e Teresa Carine, que em 1906, em São Paulo, iniciaram entre as costureiras um ruidoso movimento pela redução da jornada de trabalho para oito horas diárias.
A
história, quase sempre escrita do ponto de vista masculino, passa por cima de
nomes e personalidades femininas que sustentaram lutas duríssimas. No Rio
Grande do Norte, em 1927, uma lei eleitoral bastante singular permitiu que uma
mulher negra, Alzira Soriano de Souza, fosse a primeira prefeita eleita da
América Latina.
ALZIRA EM SEU GABINETE |
Antes, no Rio de Janeiro, em 1910, mesmo ano em que explodiu a revolta da Chibata, uma mulher chamada Leolinda de Figueiredo Daltro, defensora das mulheres e dos índios, se atreveu a fundar o Partido Republicano Feminino, eliminando qualquer tipo de intermediário masculino na representação política da mulher. Onde saber mais sobre o atrevimento dessas duas pessoas singulares?
É
impossível enumerar todas as mulheres que ajudaram o Brasil a superar formas de
preconceito e exclusão, a derrubar ditaduras e criar perspectivas seguras para
um país democrático. Se focarmos a resistência à ditadura militar, deparamos
com inúmeras mulheres que resistiram e foram tragadas pela violência criminosa
dos órgãos de repressão.
Ranusia
Alves Rodrigues, Maria Augusta Thomaz, Esmeraldina Carvalho Cunha são apenas
três nomes entre os muitos que opuseram resistência aos planos macabros dos militares.
Nesse momento, o que se espera é que o relatório final da Comissão da Verdade
abra caminhos para que se faça justiça a todas as mulheres perseguidas,
torturadas, mortas e desaparecidas sob a truculência militar. Resgatar e
revelar suas histórias são compromissos urgentes da sociedade brasileira.
Nunca
é demais lembrar que no país do futebol já houve leis proibindo mulher de
praticá-lo. Não só o futebol, mas futebol de salão e de praia, halterofilismo e
beisebol, como quiseram os militares em 1965. Getulio Vargas, em 1941, precedeu
os militares nessa burrice proibindo inúmeras atividades esportivas como
incompatíveis com as condições da mulher. Não foi sem luta que essas proibições
foram superadas. Hoje, a presença das mulheres brasileiras nas mais diferentes
modalidades esportivas garante ao país destaque internacional no cenário
esportivo...
Proibida
também por ordem do chanceler Osvaldo Aranha foi a presença de mulheres no
Ministério das Relações Exteriores, proibição só quebrada pela ação na justiça
de uma mulher, Sandra Maria Cordeiro Melo, em 1953. No ano seguinte, motivado
pelo exemplo de Sandra, o Congresso aprovou lei abrindo para as mulheres as
portas da carreira diplomática.
Mesmo
ocultas e desaparecidas dos livros didáticos, dos enredos de novelas e
seriados, documentários e até mesmo do cinema nacional, as mulheres estiveram -
e sempre estarão - presentes nos momentos decisivos da história do país. Para
quem deseja o Brasil sem memória não deve ser mesmo interessante relatar
histórias como a de Margarida Maria Alves, líder sindical dos canavieiros em
Pernambuco, assassinada na década de 1980 por ordem dos donos de engenhos
daquele estado. A capacidade de Margarida de organizar uma categoria deu muita
dor de cabeça para os poderosos pernambucanos. Para gente tão poderosa, a
solução foi muito simples: contratar jagunços e calar sua voz com meia dúzia de
balas.
A
democracia brasileira sempre terá um ar de farsa enquanto a história das
mulheres brasileiras não forem devidamente resgatadas e contadas em todos os
níveis. Não haverá democracia verdadeira enquanto uma mulher fabulosa como
Luisa Naihn não tiver sua trajetória exposta aos brasileiros. Luisa, negra
liberta, foi mãe do abolicionista Luis Gama, um incomparável lutador pela
abolição. Ninguém sabe até hoje o paradeiro de Luisa. Sabe-se apenas que participou
de muitas revoltas pelo fim da escravidão e que foi personagem importantíssima
na grande rebelião de escravos de 1835, na Bahia, a conhecida Revolta dos Malês.
LUISA NAIHN E SEU FILHO LUIS GAMA , ABOLICIONISTA . |
Enfim,
as lutas que forjaram direitos e deram ao país alguma maturidade democrática
não foram obras exclusivamente masculinas. As mulheres, de forma tão decidida
quanto os homens, também fizeram a sua parte, igualmente com muito sonho,
sangue e também vidas. Portanto, neste Dia Internacional da Mulher é preciso
chamar a atenção sobre o anonimato proposital em que foram colocadas as
incontáveis lutadoras brasileiras.
A
festa que se faz hoje tem raízes na vida tensa, atribulada, sofrida e muitas
vezes sem perspectivas dessas lutadoras, tanto as do passado como as do
presente. Por isso, mais do que flores elas merecem nossa reverência e eterna
lembrança. Elas sempre servirão de exemplo. E todo exemplo de dedicação e luta
pela democracia precisa ser lembrado, ganhar páginas nos livros didáticos,
virar tema ou personagem de filmes, teatro, cinema, novela. Enfim, para que o
país encontre caminhos e soluções mais seguras para seu aprofundamento
democrático, as grandes lutadoras sociais brasileiras precisam ser tiradas do
anonimato.
O escritor Silvio Prado mora em de Taubaté SP , é Formado pela UNITAU e PROFESSOR DE HISTÓRIA NA REDE ESTADUAL de Ensino na cidade.
Silvio
Prado
Depois
desse primoroso texto do amigo Silvio Prado, quero homenagear TODAS as mulheres
brasileiras, na figura de nossa
Presidenta DILMA VANA ROUSSEF que foi aguerrida guerreira contra a ditadura militar; foi presa, torturada e lutou pela liberdade da
nação brasileira.
À DILMA, À TODAS , O MEU RESPEITO MAIS
PROFUNDO!!!!
no dia 9 de março de 2015, ainda cabe uma singela homenagem às minhas companheiras, à grande presidenta DILMA ROUSSEF que hoje sancionou a LEI DO FEMINICÍDIO , que pune com muito mais rigor o crime cometido contra a mulher . Parabéns, minha presidenta!!!
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